O financiamento do desenvolvimento será, finalmente, suficiente para as mulheres e meninas?
Por Françoise Girard, International Women’s Health Coalition
Deixe-me apresentar uma situação. É 2030. Meninas estão na escola, buscando seus objetivos profissionais. Uma educação sexual ampla é parte do currículo escolar e meninas e meninos, têm bom entendimento sobre seus corpos e respeitam-se uns aos outros. Meninas e mulheres podem escolher se querem, quando querem e com quem querem se casar. Elas podem ter acesso a serviços de saúde reprodutiva como contracepção e aborto, não importa onde vivam. Elas vivem livres de violência.
Isso pode soar idealista, mas o mundo pode ser muito próximo desta visão se a Agenda Pós-2015 for consolidada e implementada.
Desde segunda-feira, 13, chefes de Estado, ministros, sociedade civil e líderes empresariais de várias partes do mundo na III Conferência para Financiamento do Desenvolvimento, em Addis Abeba, Etiópia, para decidir como a nova agenda de desenvolvimento global deverá ser financiada. Este é um momento crucial: em Setembro os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável ( ODS ) — modelo de desenvolvimento global para os próximos 15 anos, serão adotadas. Os ODS são as novas regras do jogo, e as discussões do Financiamento para o Desenvolvimento irão organizar este campo.
Os ODS representam um marco importante para mulheres e meninas mas, sem recursos, eles significarão pouco. Sabemos como a ausência de liderança e de financiamento podem impedir esse progresso. Considerando os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio como referência, apesar dos progressos mundiais, no seu relatório final emitido semana passada, o secretário- geral da ONU, Ban Ki –moon destacou que, infelizmente os objetivos e metas mais negligenciadas foram aqueles voltados às mulheres e meninas. Não podemos deixar que isso aconteça novamente.
Para viabilizar os ODS , a Conferência de Addis tem resolver questões econômicas críticas e barreiras financeiras ao desenvolvimento, mas o atual documento em debate está aquém do esperado, dando, por exemplo, papel preferencial ao setor privado na condução do desenvolvimento, sem garantir que, além dos lucros, haja respeito a regras que proporcionam bem-estar para as pessoas e para o planeta. O texto promove políticas comerciais que estimulam a privatização de serviços públicos essenciais, como saúde e água, restringindo assim o acesso destes bens para mulheres e pobres. Ele propõe também impor tributos a trabalhadores informais, cuja maioria são mulheres, sem garantir que as corporações transacionais paguem sua parcela justa. E deixa-se de reconhecer e abordar o impacto prejudicial que as políticas do FMI e do Banco Mundial tiveram nos países e suas inabilidades em satisfazer as necessidades básicas dos povos. Os governos fariam bem em repensar estratégias que não funcionaram no passado e que, certamente, não funcionarão no futuro.
Além disso, em vez de dedicar recursos específicos para a igualdade de gênero através do “orçamento sensível a gênero “, o documento em discussão ignora que as políticas econômicas nacionais e globais impactam de forma diferente homens e mulheres. No entanto, sabemos que as mulheres são duas vezes mais propensas que os homens a serem envolvidas em trabalho não remunerado, se beneficiam menos das políticas de proteção social, pagam uma proporção descomunal dos seus rendimentos em impostos, e sofrem desproporcionalmente com crises financeiras e econômicas e outras.
Os governos precisam considerar estes dados e corrigir as desigualdades que continuam a afetar as mulheres Porque Investir nas mulheres e meninas, afinal, é essencial para resolver a pobreza global. Os ODS oferecem uma oportunidade histórica para transformar a vida de mulheres e meninas. Podemos alcançar o mundo que queremos em 2030, mas isso exigirá liderança real, um verdadeiro comprometimento, além de financiamento adequado. Esperamos e demandamos que os nossos governos encarem este desafio em Adis Abeba.
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