G77+China: cooperação Norte-Sul deve ser o núcleo da Parceria Global
Aqui na última rodada de negociação dos ODS, chegamos naquele momento de discutir duas questões essenciais e – ainda sem respostas muito claras – sobre quem pagará esta conta e como será o processo de seguimento e revisão da Agenda dos ODS. Por isso, ainda que se considere que o conteúdo da agenda está praticamente acordada, falta bater o martelo, nesta última semana sobre como, quem e de que forma essa agenda, que trata de temas tão complexos será, de fato, implementada e monitorada até o ano de 2030.
Hoje o debate concentrou-se no tema dos Meios de Implementação da Agenda, tema completamente relacionado aos resultados alcançados na semana passada, com a terceira Conferência Internacional do Financiamento para o Desenvolvimento – FpD3 –, realizada entre 13 e 16 de julho na Etiópia, que tinha entre seus objetivos pavimentar o caminho do financiamento para os ODS. Frente a uma estrada esburacada – Addis não apresentou alternativas para novos recursos, como já comentado neste blog –, a queda-de-braço continua aqui na ONU.
E hoje foi a vez do G77 brilhar, fazendo um discurso muito elogiado pela sociedade civil e bastante articulado com as nossas preocupações, principalmente a de que, no atual contexto, a Agenda de Ação de Addis Ababa – AAAA – precisa ser considerada como complementar aos ODS e não substituir, de maneira alguma, o capítulo e metas já estabelecidas como meios de Implementação. Além disso, temos reiterado que a Ajuda Oficial ao Desenvolvimento permanece importante, mas mesmo com o alcance por todos os países do compromisso de alocação dos 0.7% do PIB, o valor arrecadado não seria suficiente para financiar toda a Agenda Pós-2015, o que demanda a identificação de novos mecanismos de financiamento. Também temos reforçado que a extrema concentração atual de riqueza impossibilita o alcance dos ODS. Sem mudanças estruturais para tratar da distribuição desigual de poder e recursos, vai ser impossível a erradicação da pobreza e redução das iniquidades. Temos insistido de que, com os ODS, chega também o momento de falarmos em democracia econômica, conceito que tem tido cada vez mais visibilidade no Brasil, principalmente a partir da campanha TTF Brasil que insiste na Taxa sobre Transações Financeiras.
Em sua fala de hoje na plenária, em nome do G77+China, a África do Sul observou que: “o aumento da globalização e da interdependência significa que o desenvolvimento sustentável não é possível sem um ambiente internacional favorável. Os países em desenvolvimento não podem alcançar o desenvolvimento sustentável sem os meios para fazê-lo. É, portanto, claro que a previsão de meios adequados e previsíveis de execução deve, por sua vez, incluir um aumento do fluxo de recursos financeiros; um aumento do acesso e transferência de tecnologias acessíveis e ambientalmente saudáveis; e um reforço das capacidades e aumento do apoio ao desenvolvimento.
A implementação também deve ocorrer com base no princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, em níveis nacional, regional e internacional pelos Estados-Membro, o sistema das Nações Unidas e as instituições financeiras internacionais. A parceria global renovada e fortalecida para o desenvolvimento, que é essencialmente uma parceria entre os governos, é necessária para este fim. Neste contexto, o Grupo reitera a opinião de que a cooperação Norte-Sul deve ser o núcleo da parceria global e Sul-Sul e a cooperação triangular é um complemento útil para a cooperação Norte-Sul.
Esses esforços podem, por sua vez, ser apoiados pela sociedade civil e pelo setor privado, que também têm responsabilidades em relação à implementação. Os nossos objetivos devem ser a erradicação da pobreza, a realização do crescimento econômico sustentado, o desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições e da qualidade de vida para o nosso povo. Os arranjos institucionais necessários exigem a melhoria do funcionamento e a coordenação entre as diferentes partes interessadas, as agências, fundos, programas e comissões regionais das Nações Unidas, as instituições financeiras internacionais e instituições regionais, bem como a Organização Mundial do Comércio.
Em particular, co-facilitadores, as instituições financeiras internacionais têm uma grande responsabilidade na implementação de compromissos internacionais e na realização dos objetivos da agenda de desenvolvimento pós-2015. A este respeito, a coerência entre as políticas financeiras e comerciais em nível global é imprescindível para a execução dos ODS em nível nacional.
No que diz respeito ao relacionamento e / ou inter-relações entre os meios de implementação da agenda de desenvolvimento pós-2015 e os resultados da 3ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o processo de desenvolvimento, o G77 e a China gostariam de salientar que os Meios de Implementação para a agenda de desenvolvimento pós-2015 não pode ser um substituto para, nem ser substituído pela, a Agenda de Ação de Addis Ababa. Em vez disso, o resultado de Addis Ababa deve ser considerado como de apoio e complementar à Parceria Global e aos Meios de Implementação para a agenda de desenvolvimento pós-2015. Os Meios de Implementação contidos em cada meta e o objetivo 17 são uma componente fundamental dos ODS, em seu próprio direito e “parte integrante da agenda que estamos a negociar. (…) O nível de ambição da agenda de desenvolvimento pós-2015 e sua execução bem-sucedida será em grande parte determinada pela qualidade da linguagem que é acordada agora no debate sobre implementação. Portanto, é neste contexto, que o Grupo dos 77 e China se opõe fortemente às propostas de que a III Conferencia de Financiamento para o Desenvolvimento deva ser plenamente integrada e torne-se o pilar de Implementação da agenda pós-2015. A Agenda de Ação de Adis-Abeba não é um substituto para os Meios de Implementação da agenda de desenvolvimento pós-2015, uma vez que não esgota todos os instrumentos e mecanismos necessários para implementar, monitorar e avaliar a parceria global para o desenvolvimento.”
Não sabemos, obviamente, como serão os movimentos políticos e articulações, ou o que virá no novo texto, depois de oposição de Europeus, e resistência dos Americanos e Japoneses, principalmente. Mas, ainda num contexto de ressaca pós-Addis este discurso do G77 soou como pura glicose em nossos fígados.
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Alessandra Nilo, jornalista, Coordenadora da Gestos, Diretora da Abong em Pernambuco, Secretária Geral da Laccaso.